terça-feira, 13 de julho de 2010

O MEDO DE EMBARANGAR


Ontem estava passando por uma daquelas lojas populares de departamento e vi na vitrine uma roupa que me interessou. Pois bem, entrei e fui experimentar. Não preciso dizer que meu corpitcho fora dos padrões Giselle não coube na famigerada camisa. Fiquei parecendo o Incrível Hulk com aquela camisa quase estourando os botões, e a cor bege-desmaiado, associada à luz reveladora dos provadores de loja feminina não valorizou nem um pouco minha pele pálida e com aparência cansada depois de um longo dia de trabalho.

Desisti da roupa, e fui pra sessão das meias. Meias são sempre úteis e sempre caem bem, até porque os pés não engordam, não têm celulite, flacidez, não ficam com olheiras depois de um dia cansativo, etc. Talvez por isso eu tenha tanta obsessão em comprar sapatos...enfim

Caminhei à fila do caixa, e, na minha frente, lá estava ela: a BARANGA! Não era dessas barangas com cara de bruxa velha que assustam a gente pela rua, era uma baranguinha. Como não tinha nada mais útil pra fazer naquela fila, fiquei observando a coitada. Era uma mulher que não parecia ter idade definida, mas que eu supus ser jovem, porque estava com um filho pequeno de colo e acompanhada do marido. O marido não era grandes coisas, mas na verdade, parecia bem mais novo que a esposa. Como eu disse, ela devia ser jovem. Além do filho pequeno estava comprando umas roupinhas de criança, devia ter outros filhos. Devia ser mais jovem que eu, ou, no máximo ter a minha idade. Mas era uma mulher judiada. Gorda, mas não dessas que sempre foram obesas mórbidas. Gordinha, daquelas que um dia foram até gostosinhas nos seus 15,16 anos. Os sucessivos partos, as preocupações com a família, as infelicidades do casamento, e o excesso de carboidratos nas refeições, foram criando uma capa protetora de gordura pras tristezas da vida.
A roupa que ela usava era pior do que feia, era sem graça. Roupa de velha. Roupa de quem nunca tem tempo ou ânimo para escolher que roupa usar. Deixava aparecer por baixo do tecido uma barriga saliente de quem não teve acesso à lipo ou às drenagens linfáticas da vida. As pernas eram cabeludas, e eu fiquei imaginando que as partes íntimas deviam ser uma mata a ser desbravada com motosserra. O cabelo era mais judiado ainda, cabelo que nunca viu uma escova ou um produto caro na vida. Um cabelo opaco, morto, sem vida. Os pés com o calcanhar rachado, as unhas com a cutícula crescida. Certamente a baranga também desconhecia os serviços de manicure e pedicure.

Pois bem, a baranga pagou sua conta, foi embora, e eu senti uma tristeza, quase que uma simpatia por ela.
Daí comecei a reparar em mim. Eu estava com uma roupa velha e surrada pra trabalhar, preta pra não ter que pensar em combinações de cores, mas que me dava um aspecto de luto. Tinha colocado sapatos sem salto pra não sentir dor nos pés. Meu cabelo estava amarrado num coque amarfanhado porque estava com a raiz oleosa, porque naquela manhã não tive tempo de lavá-lo. Não tinha passado nada de maquiagem no rosto, também por falta de tempo, e as olheiras beiravam as minhas bochechas pelo cansaço da noite mal dormida (ando com insônia, será que é a idade?), e a minha pele tinha um bege pálido de quem passa a maior parte do seu tempo dentro de um escritório. A depilação estava ok, mas não dava pra ver porque eu estava de calça comprida. Sim, os quilinhos a mais estavam todos lá (a camisa do Hulk que o diga), e por estar na TPM eu me encontrava mais inchada ainda. Daí pensei: até onde aquela mulher era menos baranga que eu? Qual o limite exato pra alguém se transformar de uma moça jovem e bonita a uma simples baranga? Quão desarrumada alguém tem que estar para que os outros cheguem à conclusão que embarangou?

De fato, não sei. Só sei que saí de lá, troquei de roupa, coloquei meu tênis e fui fazer caminhada. Cheguei em casa e ignorei as porcarias. Comi peito de peru com pão integral e uma fatia de escarola. Fui dormir com fome, mas lembrei da baranga e a fome cedeu. Acordei mais cedo hoje, tomei um banho com todos os óleos e sabonetes esfoliantes que eu tinha no banheiro. Não dispensei o rímel, o batom e o blush, e disfarcei as olheiras e as espinhas com um corretivo discreto. Esqueci a preguiça e coloquei um salto alto. Caprichei um pouco mais na roupa, aliás, já separei a roupa que eu ia usar na noite anterior. Fiz uma escova no cabelo. Baranga? Eu? Jamais!

Angel



Este texto não teve nenhuma interferência de Balzaks, uma vez que ela está no banheiro passando massa corrida e todos os makes possíveis, apertando a alça do sutiã e fazendo uma listinha de compras de sacolão.

3 comentários:

Anônimo disse...

eis que pela primeira vez ouvi uma explicação racional para o fetiche por pés!

haushuashauhsa

Shisuii

Unknown disse...

Angels, já te disse que adoro vir aqui e ler seus textos? Que advogar que nada, vc devia estar na equipe de roteiristas e novelistas da Globo. Beijao, GUI

Anônimo disse...

Aprendi muito